Por: Matheus Felipe de Castro
Calma! Ele não me passou procuração alguma (ainda). Mas me sinto no dever de sair em defesa do mandato do deputado eleito Tiririca. Na verdade, em defesa da vontade de 1.353.820 (um milhão, trezentos e cinquenta e três mil, oitocentos e vinte) eleitores que, bem ou mal, resolveram escolher o palhaço como seu representante em Brasília.
Sim! Diz a Constituição da República que vivemos em uma democracia derivada da soberania popular: "todo o poder emana do povo e em seu nome é exercido, através de representantes eleitos". Muitos concordam de maneira acrítica com essa declaração e tantos outros simplesmente a rejeitam, como se ela fosse mentirosa e desnecessária.
No entanto, a democracia não é uma coisa pronta e acabada, mas um processo em andamento, em construção. E ao contrário do que muitos opinam, a democracia não pode ser construída com menos democracia, mas com mais democracia.
A eleição de Tiririca, com uma das maiores votações da história, reflete o descontentamento do povo brasileiro para com a política liberal e os políticos burgueses. Talvez por acharem a política uma "palhaçada" é que resolveram entregá-la finalmente a quem de direito.
O fato é que o voto de protesto não deixa de ser menos voto que o dito "voto consciente" (one man one vote). Aliás, aqueles que acreditam ser os monopolizadores da consciência, deveriam, nesse momento, se conscientizar de que a democracia é um processo de profundo aprendizado político, onde o povo, por meio de avanços e revezes, acúmulos e desacúmulos, erros e acertos, vai se educando politicamente.
Educação política nada tem a ver com educação escolar ou técnica. Somos um país de milhões de analfabetos políticos (Brecht), inclusive portando diplomas de curso superior e não raras vezes de pós-graduação (mestrado e doutorado). Educação política é outra coisa e o povo brasileiro não vai ser ensinado a fazer política por nenhum professor (ou elite) que se acredite iluminado (a).
O aprendizado político do povo deve ser uma experiência, que deve sim encontrar orientação e respaldo nas forças políticas mais consequentes e engajadas de nossa sociedade (sim, acredite: essas forças políticas existem e estão aí dando sangue e suor no dia-a-dia para que um Brasil melhor possa ser construído), mas deve ser realizado na prática, na cotidianidade que marca a evolução de um povo.
Ora, eis que o Ministério Público Eleitoral de São Paulo ofertou denúncia (acatada pela Justiça) contra o deputado eleito, sob a acusação de um crime hediondo: ser analfabeto! No país das hedionduras, quem deveria ser denunciado por essa mazela social é o próprio Estado que até agora, pouco fez para superar séculos de atraso social e econômico que afligem a população brasileira! Individualiza uma questão coletiva e a imputa àquele que, com todos esses estigmas, acabou superando suas determinações e vencendo na vida.
Os analfabetos políticos do Judiciário e do Ministério Público, premidos por tantos outros analfabetos políticos das elites paulistas (talvez as mesmas que promoveram, através da mídia hegemônica, um ataque sem precedentes contra aquele que seria o primeiro senador negro e de origem pobre de São Paulo) agora querem cassar o diploma daquele que encontra amplo respaldo popular? Logo o Judiciário e o Ministério Público que, escolhidos em concursos dirigidos por seus pares de elite, historicamente se ressentem de um histórico deficit democrático?
Tiririca deve ser diplomado e uma vez diplomado deve ser empossado. Ele representa a cara do povo brasileiro, com suas belezas e feiúras. De milhões que, como ele, não tiveram oportunidade de estudar e ter uma vida melhor mediante o acesso aos bens fundamentais que a Constituição diz garantir a todos mas que, na prática, acabam sendo de muito poucos. E que, embora tudo isso, acabou, através de seu humor e irreverência, se tornando conhecido em todo o Brasil. Ele representa, de verdade, os seus representados: analfabetos, famintos, descamisados, sem lar...
Tiririca pode vir a ser um bom deputado! Em sua simplicidade, recentemente, afirmou que pretende realizar um mandato voltado para os mais pobres. Ou seja, já demonstrou que tem compromisso (que é o elemento mais importante para um representante do povo), embora não detenha, ainda, os conhecimentos que as elites preconceituosas estão lhe cobrando. Se não conseguir se desincumbir do papel, que seja defenestrado pelo mesmo meio pelo qual foi eleito, daqui a quatro anos, pela vontade popular.
Mas cassar, por meio da "Justiça", a vontade de uma parcela significativa do eleitorado de São Paulo, é um ato injusto, de extremo autoritarismo (para não se referir ao preconceito que carrega) e que deve ser repudiado por todos os democratas e progressistas que aspiram pela construção de um regime que inclua, de verdade e não somente nas declarações constitucionais, a maioria do povo brasileiro nos processos de participação que configuram uma VERADEIRA DEMOCRACIA POLÍTICA, ECONÔMICA E SOCIAL.
Mas é evidente que os poderosos e despotas de plantão vão fazer de tudo para usurpar de um verdeiro representante das minorias os direito de ascender ao Poder. Pois o Tirica representa o que há de mais sério neste país, o direito sagrado do povo assumir o poder. Como eu já havia dito, vão se utilizar da máquina judiciária para cercear a sua representação sob a alegação de analfabetismo ou qualquer outra desculpa esfarrapada. A ascensão do Tirica é tapa na cara dos déspotas, pois escarra na cara dos poderosos a sua incompetência com a res publica, escarra na cara de todos a corrupção, os despreparo dos diplomados em usar do cargo para fazer justiça social. Não há como deixar de mencionar que escarra na cara dos aristocratas que um representante da alegria inocente dos mais de 90 milhões de miseráveis deste país conseguiu ascender ao Poder de forma legítima e democrática e isto incomoda. Incomada os politicos engravatados que assumiram o poder por força do dinheiro podre dos banqueiros, dos fazendeiros (grilheiros) e de uma classe média estupida, que no mais incrível fenômeno de ignorância coletiva chegou a defender a ditadura militar, se esquecendo dos verdadeiros heróis, que derramaram seu sangue em nome da liberdade e da democrácia. Pois é, temo que o correto seja dar direito a eleger coronéis do Maranhão, da Bahia, como seus filhos e netos de mesmo nome, ostentando seus ternos armani e seus relógios mont blanc, comprados com o desvio de verbas públicas que salvaria a vida dos nordestinos e de tantos outros descamisados deste país de palhaços.
ResponderExcluirPor Fúlvio Stadler
Meus parabéns Matheus!Concordo que essa cassação de gabinete seria um verdadeiro atentado contra a democracia.Porém, como verdadeiro Brizolista, vou adiante: acho que por trás desta atitude há o desejo de cassar o deputado eleito e ex-delegado Protógenes Queiróz, que pode complicar a vida dos verdadeiros criminosos de nosso Brasil.Grande abraço, Tico Lacerda
ResponderExcluirSENSACIONAL, Prof. Matheus!
ResponderExcluirTESÃO os comentários tb - Fulvio e Lacerda!
Inspirada em você, rabisquei sobre o assunto!
Quando crescer, quero escrever assim!
Beijukkkiss
Matheus, está quase me convencendo. Copiei o teu texto e postei no meu blog, indicando a fonte. Também estou agora seguindo o teu blog; tem um link para ele no www.aprenderdireito8.blogspot.com
ResponderExcluirForte abraço,
Horácio
Meu caro professor. Sem divergir uma linha de seu texto, penso que a eleição de Tiririca e sua tentativa de cassação podem suscitar um debate jurídico de que ainda não tive notícia; o da existência de uma contradição constitucional. Admitindo-se por hipótese o analfabetismo de Tiririca, e eleito deputado federal, teria ele infringido o §4º, do artigo 14, da CF, o mesmo (artigo) que lhe dá o direito facultativo de voto (alínea a, inciso II).
ResponderExcluirOu seja, lhe dá o direito de votar e lhe nega o direito de ser votado, em contradição aberta, smj, com o caput do artigo 5º.
É verdade que sua excelência, o MP, está encontrando uma "saidinha" jurídica para fundamentar a cassação, que seria uma certa "falsidade ideológica", ou coisa parecida. Mas o fundo da questão, me parece que remete a esta questão constitucional. Sendo o sr. um professor, quem sabe poderia localizar tal questão em Bobio, ou noutro pensador jurídico por mim desconhecido, para que possamos nos antecipar e fazer um debate salutar acerca da questão...
Bom dia, Dr.! Bem, conheci seu blog por através de artigo que foi escrito brilhantemente e que teve um impacto positivo. Li o artigo aqui (http://alexandremoraisdarosa.blogspot.com/) e gostei muito. Motivo pelo qual, ao visitar esse espaço, não hesitei em segui-lo. Tenho um blog e dia desses atrevi-me escrever sobre o assunto. Mais confesso: nada se comparado a maestria com que o tema foi abordado aqui. Atrevo-me a brincar e dizer que tal maestria só poderia vir mesmo de um eleitor do Lula (orgulhosamente, também sou um!). Dr., sou acadêmico de direito e me propus criar um blog para aprender sobre vários assuntos que não encontramos nos bancos acadêmicos. Posso dar um exemplo, como bem o dr. disse nesse artigo, educação política. Assim, gostaria que, se possível, o dr. se tornasse seguidor do meu blog. Já inseri um link direto para melhor facilitar ler suas postagens. Vá no meu blog e observe nos blogs que eu sigo, que são disponibilizados conforme atualização. Um abraço, Dr.!
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