"Nossa cultura é a macumba, não a ópera. Somos um país sentimental, uma
nação sem gravata"
(Glauber Rocha)


quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Matheus Felipe de Castro: Discurso de Defesa do Dr. Ricardo na Câmara de Florianópolis

Disponibilizo aos amigos e amigas a transcrição taquigráfica do discurso que proferi em defesa do Vereador Dr. Ricardo no dia 14/02/11






Câmara Municipal de Florianópolis
Sessão de julgamento em plenário do Vereador Dr. Ricardo
14/02/2011


Excelentíssimo presidente Jaime Tonello
Excelentíssimo primeiro secretário, vereador Badeko
Excelentíssimo segundo secretário, vereador Dr. Ricardo
Excelentíssimos membros do Conselho de Ética desta Casa


Primeiramente, quero manifestar aos senhores o meu profundo respeito por esta Casa e por todos os seus parlamentares. No entanto, como define o Código de Ética do Advogado, “nenhum temor de desagradar a juiz, promotor ou qualquer outra autoridade pública deve obstar o advogado a realizar a sua defesa”. Portanto, o discurso que farei aqui hoje nada tem de pessoal com ninguém nesta casa. Trata-se da busca da verdade e da justiça, nada mais.

Mas eu gostaria, antes de iniciar meu discurso, realizar um último cumprimento, uma homenagem ao personagem principal da democracia: o povo de Florianópolis que hoje enche os corredores desta Casa, porque como dizia Castro Alves, o Parlamento é do povo como o céu é do condor!

A IMPUTAÇÃO

Dr. Ricardo é acusado de conduta atentatória à ética e ao decoro parlamentar, eis que teria, segundo a acusação, oferecido a venda de seu voto à chapa encabeçada pelo próprio acusador, Vereador João da Bega, cuja pena cominada é a de perda do mandato.

OS FATOS

Ocorre que a imputação é falsa e configura evidente crime de denunciação caluniosa!

Os fatos vieram à tona numa situação esdrúxula. Logo após a eleição da nova mesa diretora desta casa, o Vereador Acusador teria se deixado surpreender num momento de desabafo, onde ele lamentava não ter podido cobrir uma oferta de venda de voto: “FALTOU DINHEIRO”, dizia o vereador acusador!

Situação estranha esse inocente desabafo frente aos jornalistas e cinegrafistas. Logo ele que se gaba de sua experiência de 05 mandatos nesta casa!

Ora, Excelências, inocência nenhuma! Na verdade, o teatro estava sendo armado neste momento!

Na seqüência, o prefeito da Capital apareceu na mídia fazendo acusações a 03 vereadores desta casa, tendo posteriormente recuado diante de dois deles, inclusive do Dr. Ricardo. Na verdade, nesse momento, já ficara dividida a responsabilidade pelas acusações com o candidato a presidente da mesa derrotado.

O prefeito inclusive disse, expressamente aos jornalistas, que não faria denúncia alguma se o seu grupo político houvesse vencido o pleito da Mesa, o que por si só coloca em xeque a credibilidade de suas acusações.

Armado o teatro, imediatamente a verdadeira intenção das acusações veio à tona: 04 vereadores desta casa, todos eles membros do grupo político derrotado no pleito, ingressaram com um Mandado de Segurança na Justiça local pedindo a anulação do pleito para a Mesa Diretora desta casa, com base nas acusações de tentativa de venda de votos, o que foi considerado uma DIVAGAÇÃO pelo excelentíssimo Juiz Hélio do Vale Pereira. Vejamos o que diz o magistrado (segue a leitura do despacho no Mandado de Segurança).

Criaram um factóide e tentaram se beneficiar da sua própria torpeza: perderam!

Como o intuito principal não foi alcançado (ganhar a mesa diretora no tapetão), mantendo o controle da casa nas mãos do grupo político liderado pelo PMDB em caso de condenação do prefeito Dário no caso dos prefeitos itinerantes, restou um problema a ser resolvido: uma acusação falsa havia sido levantada e se alguém não fosse punido, iria para o lixo a credibilidade do prefeito e do vereador acusador!

Como solucionar o problema criado?

Infelizmente, a forma encontrada foi a mais torpe de todas: a criação de testemunhas inidôneas, porque participantes do grupo político perdedor no pleito da mesa diretora desta casa, para fundamentar uma condenação sem provas!

Nenhuma prova material apareceu, como ressaltou o juiz em sua decisão, que li agora à pouco. Nenhuma testemunha idônea foi trazida a estes autos a fundamentar as acusações levianas do Vereador Acusador.

Arrolou seus aliados políticos para testemunharem contra o vereador Dr. Ricardo, dando seqüência ao seu factóide, tentando manter a sua credibilidade já maculada e tentando evitar uma acusação por denunciação caluniosa na justiça e no conselho de ética desta casa.

Eis, excelentíssimos vereadores, o nó do problema!

Não há qualquer prova idônea a macular a honra e a conduta do Vereador Dr. Ricardo a não ser mentiras e calúnias criadas e reproduzidas por um grupo político que saiu derrotado no pleito para a mesa diretora desta casa!

A utilização de duas testemunhas juridicamente suspeitas de parcialidade, porque fazem parte do mesmo grupo político e tem interesse comum no desfecho da causa é expediente abjeto e reprovável de ser executado por pessoas da mais alta estirpe, porque representantes eleitos do povo de Florianópolis.

O CPC é claro nesses casos:

Art. 405, § 3º, IV: São testemunhas suspeitas as que tiverem interesse no litígio

O Código de Processo Penal é mais claro ainda quando afirma, em seu art. 214, que não poderão funcionar como testemunhas pessoas suspeitas de parcialidade ou indignas de fé.

O Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina já decidiu dezenas de vezes que testemunhos de pessoas filiadas a partidos políticos em prol de seus correligionários é indigno de fé. Vejamos (segue leitura de acórdãos do TER/SC).

Ora, excelências, o relator do processo do Vereador Dr. Ricardo, vereador Erádio Gonçalves, de forma democrática e apegada aos direitos fundamentais, o considerou inocente das acusações feitas pelo vereador acusador.

No entanto, uma manobra, um golpe se instalou naquele conselho, quando três membros pediram vistas do processo e apresentaram um relatório substitutivo preparado às pressas, indicando a condenação do colega.

Os três pertencem também ao mesmo grupo político do prefeito e do vereador denunciante. Portanto, também eles seriam suspeitos para julgar uma causa como essa.

Tanto isso é verdade que no dia da apresentação do relatório final o vereador Dalmo, relator do caso do vereador Asael, pediu que constasse em ata de audiência a atitude suspeita dos seus colegas ao pedirem vistas conjuntas do procedimento. Vejamos (segue leitura da ata do Conselho de Ética).

Por tudo isso, fica evidente que foi instaurado aqui, nesta casa, um verdadeiro tribunal de exceção com a intenção de caçar as bruxas do pleito da mesa diretora.

PERIGOSO PRECEDENTE QUE SE ABRE NESTA CASA e que implodirá se cada vez que um grupo político derrotado no debate e no voto tentar caçar colegas com base em acusações falsas!

É princípio consagrado no direito brasileiro o “in dúbio pro reo” (art. 386, VII, do CPP), pelo qual uma condenação só pode se fundamentar na certeza absoluta da existência do crime. A dúvida não autoriza uma condenação porque a dúvida é a certeza dos loucos, daqueles que não julgam, daqueles que serão julgados!

Dirão alguns que se trata de uma decisão política, não jurídica. Mas será que a política autoriza a condenação de um inocente? Será que a política autoriza a utilização de provas inidôneas e testemunhas suspeitas?

Não! A Política, com p maiúsculo, forma mais perfeita do relacionamento humano, não admite essa corrupção da alma!

Como dizia Malatesta, o interesse da sociedade não é simplesmente o de achar um culpado para a expiação dos crimes sociais, mas encontrar o verdadeiro culpado deles. Se os inocentes começassem a ser condenados, toda a confiança na convivência social seria irremediavelmente abalada.

Outros, ainda, dirão que a opinião pública pede uma punição! Mas não foi exatamente a opinião pública que aos pés da cruz gritava “CRUCIFICAI-O!” ?

Não, não queremos criar nem culpados nem mártires, nem Judas nem Cristos. Queremos somente que a verdade prevaleça.

Enfim, diante desses argumentos, clamo que Vossas Excelências absolvam o vereador Dr. Ricardo, porque como lembrava La Bruyére “UM CULPADO PUNIDO É EXEMPLO PARA A CANALHA, MAS UM INOCENTE CONDENADO É O MARTÍRIO DE TODOS OS HOMENS HONESTOS”.

Matheus Felipe de Castro
Advogado Criminalista
Professor Doutor de Direito Penal e Processual Penal na Universidade Federal de Santa Catarina