"Nossa cultura é a macumba, não a ópera. Somos um país sentimental, uma
nação sem gravata"
(Glauber Rocha)


domingo, 23 de dezembro de 2012

Liberalismo e Razão Populista

Liberalismo e razão populista Por: Matheus Felipe de Castro, professor de Filosofia do Direito da UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina Embora para certo senso comum as “ideologias” estejam mortas, qualquer observador minimamente atento percebe rapidamente como elas ditam inexoravelmente os comportamentos políticos. E o governo Dilma não tem passado ileso ao ataque ideológico que prepara o caminho dos “consensos” conservadores que tentam inviabilizá-la econômica e politicamente para 2014. As comparações com Cristina Kirchner ou Hugo Chávez e a sempre imputação da pecha de “dirigista”, “intervencionista” e “populista” são algumas das armas ideológicas manejadas com maestria pela mídia e pelos partidos conservadores que amargam longa síndrome de abstinência de governar o país com a batuta do velho e desgastado Consenso de Washington. O Liberalismo, ou ideologia do “laissez faire”, é a ideia de que a sociedade, deixada por si mesma e guiada pelo voluntarismo do egoísmo individual seria capaz de gerar um complexo de organização social onde o bem estar individual seria a causa do bem estar coletivo. No entrecruzamento de livre iniciativa e livre concorrência, teríamos uma autorregulação que tornaria a esfera política meramente acessória e sancionatória dos excessos individuais. É realmente uma bela ideia no terreno da razão pura. Mas cuja razão prática do desenvolvimento das forças produtivas vem demonstrando não passar de uma bela teoria: “amigo, toda teoria é cinzenta para conter a árvore verde da vida”, já dizia Goethe. E o Liberalismo demonstrou que, deixado por si mesmo, não gera bem estar coletivo, mas apenas concentração excessiva da renda nas mãos de poucos em detrimento de muitos. Desde a Grande Depressão, o New Deal rooseveltiano e a obra de J. M. Keynes pudemos perceber, na prática e na teoria, que a economia não prescinde de uma direção política consequente, que seja capaz de direcionar o processo do crescimento para fins sociais diversos daqueles que movem os capitalistas individualmente, aquilo que Delfim Netto chama de “espírito animal” do empresariado. Já que o desenvolvimento não é um processo espontâneo, um “fiat lux”, demandando induções e provocações que o Estado pode lhe conferir, ele sempre poderá ser suscitado a partir da oferta ou da demanda de capital nos mercados. O desenvolvimento brasileiro sempre preferiu a primeira modalidade, injetando capitais no bolso dos capitalistas em detrimento dos trabalhadores e consumidores. O grande feito de Lula e Dilma foi demonstrar que o país poderia crescer impulsionando a demanda, a partir do consumo das famílias, o que foi implementado mediante políticas de distribuição de renda e valorização do trabalho que equilibraram a velha balança da distribuição de renda no Brasil, o que evidentemente vem gerando descontentamento por parte da burguesia associada e dependente brasileira. E é exatamente esse tipo de intervenção consciente de um Estado politicamente dirigido que assusta os setores mais conservadores e que leva à pecha do “populismo” por muitos repetido de forma tagarela, sem conhecimento do seu real sentido: uma política de inversão da relação de concentração do capital a partir da inversão da lógica reprodutiva calcada no desenvolvimento do capital para o desenvolvimento do trabalho. Coube a Ernesto Laclau o mérito de nos mostrar, a partir do seu La Razón Populista, que o populismo é uma lógica política surgida em momentos de crise hegemônica que interpela os trabalhadores (povo) de maneira a antagonizá-los com o bloco de poder dominante. E que o populismo foi a política que permitiu às nações latino-americanas se descolar relativamente do peso excessivo de exploração imposto pelo Centro do sistema-mundo capitalista. O fato é que, nos momentos onde o tal “populismo” esteve em alta na América Latina, a periferia do sistema alcançou avanços desenvolvimentistas, com melhorias reais na qualidade de vida de seus povos. E ao mesmo tempo, foram os momentos mais críticos em política, pelo acirramento de uma velha contradição que move a história e cujo conceito há muito foi varrido dos dicionários dos “formadores de opinião” conservadora de plantão.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Judiciário: da berlinda ao contra-ataque...no Pinheirinho



O Pinheirinho é uma resposta. Uma demonstração de força.

Por: Volnei Rosalen

Impossível não chocar-se com as cenas de violência contra os moradores do Pinheiro. Impossível não revoltar-se com a forma como o Judiciário de São Paulo determinou e fez cumprir a violenta desocupação.
Mas há um elemento ainda mais preocupante quando se faz a análise do sentido emprestado à ação do Judiciário, diante do momento de forte sacudida e contestação que enfrenta. Contestação que reflete nada mais nada menos que a necessidade de que o Judiciário efetivamente se democratize. Após mais de 120 anos de República, insiste-se de dentro e de fora, em não democratizá-lo.
Pinheirinho é um aviso. O judiciário encontra-se na berlinda por sucessivos questionamentos contra alguns juízes e tribunais. E pela forma como se tenta evitar que a sociedade participe do debate, até agora monopolizado pela mídia. Em meio a tantas e tão consistentes críticas, surge o Pinheirinho. Impossível não ligar uma coisa à outra.
O Pinheirinho é uma resposta. Uma demonstração de força. Não do Judiciário, mas do capital. A despeito do digno esforço de grande parte dos juízes e de algumas associações e dos sindicatos de trabalhadores, o judiciário não se democratiza. Permanece como o espaço de poder do Estado sobre o qual não se impõe nenhum tipo de controle da sociedade. Não deve explicações à sociedade, apenas a si mesmo. Não deve explicações aos demais poderes, ao contrário, paira sobre eles como poder supremo e soberano, decidindo sobre praticamente tudo.
Um poder demasiado, mas consentido. Consentido pela judicialização da maior parte dos conflitos sociais, e portanto políticos, da atualidade.
A combinação de judicialização com falta de democracia, torna a sentença a última fronteira da defesa dos interesses do capital, sob a força poderosa e incontestável do cumpra-se. E o judiciário, especialmente seus tribunais, inclinam-se suave e persistentemente para o conservadorismo.
Em meio ao debate dos últimos meses sobre o judiciário, o Pinheirinho é um aviso. É preciso ter coragem para realizar uma reforma democrática e democratizante do judiciário. O capital financeiro, através de suas agências, há muito já vem atuando para um judiciário moderno... e dócil aos seus interesses.

Volnei Rosalen, é Diretor do Sinjusc e do Centro de Estudos e Pesquisas em Trabalho Público e Sindicalismo