"Nossa cultura é a macumba, não a ópera. Somos um país sentimental, uma
nação sem gravata"
(Glauber Rocha)


quinta-feira, 21 de abril de 2011

Dilma: Reforma do Conselho de Segurança não é capricho do Brasil, a ONU envelheceu



Em discurso pronunciado durante a comemoração do Dia do Diplomata, em Brasília, a presidente Dilma Rousseff voltou a defender a reforma do Conselho de Segurança da ONU, afirmando que não se trata de “um capricho do Brasil”, mas de uma necessidade objetiva decorrente das mudanças na geopolítica mundial. “A ONU envelheceu”, constatou.

A presidente reafirmou as prioridades da política externa enfatizando a defesa da integração política e econômica dos países latino-americanos e o fortalecimento do Mercosul. Em sua opinião, a orientação prevalecente nas relações internacionais está estreitamente associada à política interna, compondo um mesmo projeto nacional de desenvolvimento.

Dimensões de uma mesma política

- A política externa de um país – argumentou - é mais do que sua projeção na cena internacional. Ela é também um componente essencial de um projeto nacional de desenvolvimento, sobretudo em um mundo cada vez mais interdependente. As dimensões interna e externa da política de um país são, pois, inseparáveis.

A prioridade da política externa ficou evidente na escolha da Argentina como o primeiro país a ser visitado pela nova presidente. “A integração [latino-]americana revelou-se importante instrumento para a aproximação de toda a região, o que se expressou na criação da Comunidade dos Povos da América Latina e do Caribe, a Celac”, ressaltou Dilma.

- Os países do nosso continente tornaram-se valiosos parceiros políticos e econômicos do Brasil, e nós sabemos que os destinos da América do Sul, os destinos de cada um dos países e os nossos estão indelevelmente ligados.
Nossa região – América do Sul – tem [teve] um crescimento médio de 7,2% em 2010 e transformou-se em um polo dinâmico do crescimento mundial.

Defesa do Mercosul

Ela fez uma defesa do Mercosul, bloco econômico que tem sido duramente criticado pela direita neoliberal e por viúvas da Alca. O candidato tucano que concorreu às eleições presidenciais do ano passado contra Dilma, José Serra, chegou a sugerir o fim do Mercosul, realçando as contradições no interior do bloco e insinuando que mais atrapalha do que ajuda. A presidente enaltece os resultados do mercado comum.

- Hoje, quando comemoramos 20 anos do Tratado de Assunção, que criou o Mercosul, temos muito a celebrar. Nesse período, o comércio intrabloco saltou de US$ 4,3 bilhões para US$ 44 bilhões. Expandimos o Mercosul horizontalmente, transformando um projeto, inicialmente comercial-tarifário, em uma integração mais profunda entre o Brasil e seus vizinhos do Cone Sul.

Reconhecimento

Na opinião da presidente, a projeção que o Brasil ganhou no mundo ao longo dos últimos anos reflete “a percepção que a comunidade internacional passou a ter das transformações pelas quais nosso país vem passando. Depois de décadas de estagnação, o Brasil retomou o crescimento - um crescimento distinto daquele do passado – agora, a partir do governo do presidente Lula, acompanhado de intensa distribuição de renda e de forte inclusão social.”

- Descobrimos, nós, brasileiros, que as políticas sociais não podiam estar separadas da política econômica, como se fossem mero complemento ou elemento de compensação da política econômica. Nosso desenvolvimento começou a recuperar a infraestrutura física, social e energética do país. Construímos o equilíbrio macroeconômico e fomos capazes de reduzir nossa vulnerabilidade externa. Deixamos de ser devedores e passamos à condição de credores internacionais. Essa grande transformação ocorreu com o fortalecimento da democracia, com o respeito aos direitos humanos e com a política de preservação do meio ambiente.

Ao mesmo tempo, frisou que ainda restam “inúmeros e grandes desafios pela frente. O mais importante deles é o de superar a pobreza extrema. Nós dizemos: ´País rico é país sem pobreza´. E isso implica, necessariamente, uma definição de estratégia e de caminhos. E mais, sabemos também que para sermos uma grande nação, próspera e democrática, precisamos realizar um grande esforço para assegurar educação de qualidade para todos os jovens e as jovens brasileiros, mobilizando todas as nossas capacidades para desenvolver a pesquisa científica e tecnológica e entrarmos no caminho da inovação em todas as áreas da nossa atividade. Esses são, sem dúvida, os integrantes do nosso passaporte para a economia do conhecimento, permitindo que enfrentemos a dura competitividade econômica internacional. São, sobretudo, instrumentos para a construção de uma verdadeira cidadania.

Instituições obsoletas

As instituições internacionais de outrora se tornaram obsoletas, segundo a presidente. “A governança econômica global herdada no século passado sucumbiu à crise financeira de 2008, juntamente com o dogma da infalibilidade dos mercados financeiros. O G-7 foi deslocado pelo G-20 na discussão das saídas para a crise e na condução das reformas que aumentaram o poder de voto dos países emergentes no Fundo Monetário Internacional e no Banco Mundial. Mas há muito o que fazer. Há que reformar essa governança e dar a ela a representação que os países emergentes têm hoje no cenário internacional.”

- No momento em que debatemos como serão a economia, o clima e a política internacional no século XXI, fica patente também que, do ponto de vista da segurança, a ONU também envelheceu. Os eventos mais recentes nos Países Árabes e no norte da África mostram uma saudável onda de democracia, que desde o seu início apoiamos. Refletem também a complexidade dos desafios dos tempos em que vivemos. Lidamos com fenômenos que não mais aceitam políticas imperiais, certezas categóricas e as respostas guerreiras de sempre.

- Reformar o Conselho de Segurança das Nações Unidas não é, portanto, um capricho do Brasil. Reflete a necessidade de ajustar esse importante instrumento da governança mundial à correlação de forças do século XXI. Significa atribuir aos temas da paz e da segurança efetiva importância. Mais do que isso, exige que as grandes decisões a respeito sejam tomadas por organismos representativos e, por essa razão, mais legítimos.

Comércio Sul-Sul

Dilma também valorizou a estratégia adotada já no governo Lula de diversificar as relações econômicas e políticas do país, de forma a reduzir a dependência frente ao chamado Ocidente (EUA, Europa e Japão). Tal orientação resultou no estreitamento das relações diplomáticas com a África, o Oriente Médio e a Ásia, onde se destaca a China (que se tornou a maior parceira comercial do Brasil em 2009), além da união dos países que compõem o Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).

- A compreensão da universalidade de nossos interesses nos leva a estreitar as relações diplomáticas e abrir novos canais de diálogo político e de cooperação econômica com o continente africano e com o Oriente Médio. Essa iniciativa não se deve apenas, no caso da África, aos laços históricos e culturais que nos une. Ela leva em conta as enormes potencialidades desse continente, com os seus 800 milhões de habitantes e seu rico território. A África, sem sombra de dúvida, tem um futuro extraordinário.

China, Ibas e Brics

- Também nos lançamos em novas frentes de cooperação na Ásia, em especial com a China, com a Índia, com a Coreia do Sul e com o Japão, centros de grande dinamismo tecnológico e econômico, com os quais pretendemos ampliar e diversificar oportunidades de negócios nos marcos de franca reciprocidade. A palavra será e é sempre: reciprocidade. Acabo de regressar de Pequim, onde tive a oportunidade de transmitir uma mensagem clara a nossos aliados estratégicos. Queremos aumentar o nosso comércio, mas também diversificá-lo. Não temos por que envergonharmo-nos de nossa condição de grande exportador de commodities, mas, ao mesmo tempo, queremos expandir nossas exportações com valor agregado.

- O fórum Índia, Brasil, África do Sul, o Ibas, mostra que a democracia e a solidariedade são armas poderosas para superar a pobreza, e daremos a esse fórum a importância que ele merece. A recém concluída Cúpula dos BRICS, na China, reafirmou o objetivo dos grandes países emergentes por uma ordem internacional mais democrática e representativa do mundo do século XXI.

O ministro das Relações Exteriores, Antonio de Aguiar Patriota, também discursou durante o evento em comemoração ao Dia do Diplomata, realizado na manhã desta quarta-feira (20) no Itamaraty. Na sequencia, ocorreu a cerimônia de formatura da turma 2009-2011 do Instituto Rio Branco, que teve como patrono e paraninfo, respectivamente, o embaixador Paulo Nogueira Batista e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=152449&id_secao=1

terça-feira, 19 de abril de 2011

Batalha da Praia de Girón: Cuba celebra 50 anos de socialismo

Raúl Castro propõe limite de dez anos para mandatos em Cuba



O presidente de Cuba, Raúl Castro, defendeu no último domingo (17) que o período de permanência em cargos públicos no país seja de, no máximo, dois mandatos de cinco anos. Segundo Raúl, a proposta será levada à Convenção Nacional do partido, marcada para o final de janeiro do ano que vem.

Em discurso durante Congresso do Partido Comunista Cubano, Raúl Castro disse que a liderança do partido precisa de uma “renovação sistemática” e deve se submeter a uma intensa autocrítica. Aos 79 anos, o presidente assumiu o poder em 2008, sucedendo o irmão Fidel, que esteve à frente do país por 32 anos.

A proposta de limitar o tempo de mandatos políticos na ilha é inédita. A ideia completa uma série de mudanças que ocorrem desde o ano passado em Cuba. O objetivo é reduzir os gastos do Estado e melhorar a produtividade da ilha.

Para Raúl Castro, o processo de atualização do modelo econômico cubano deve levar pelo menos cinco anos. Segundo ele, os sistemas de educação e saúde vão ser mantidos gratuitos, mas outros serviços na área social vão sofrer cortes “racionalizados”. O presidente não detalhou esses cortes.

De acordo com o governo, 200 mil pessoas já se registraram para trabalhar como autônomas desde que as mudanças foram anunciadas, em outubro do ano passado. O número foi o dobro do que ocorre atualmente. Raúl Castro disse ainda que o caráter socialista do regime cubano era “irreversível”.

O congresso foi precedido de uma das maiores paradas militares vistas no país nos últimos anos. O desfile marcou o 50º aniversário da tentativa frustrada dos norte-americanos de invadirem Cuba, pela Baía dos Porcos.

Centenas de milhares de cubanos saíram às ruas em Havana para celebrar a data do triunfo sobre os Estados Unidos. Desde fevereiro de 1962, o regime cubano está submetido a um embargo econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos.

Reflexões de Fidel Castro: Minha ausência do Comitê Central



O líder da Revolução Cubana explica nesta Reflexão as razões por que, além de não exercer mais nenhum cargo de chefia do Partido e do Estado, não integrou a lista de membros do Comitê Central eleito no Congresso do Partido Comunista Cubano que se encerra nesta terça-feira (19) em Havana.

Já conhecia o informe do companheiro Raúl ao 6º Congresso do Partido.

Ele tinha me mostrado vários dias antes por sua própria iniciativa, como fez com muitos outros assuntos sem que eu solicitasse, porque eu delegara, como já expliquei, todos os meus cargos no Partido e no Estado na Proclamação de 31 de julho de 2006.

Fazê-lo era um dever que não vacilei um instante em cumprir.

Sabia que meu estado de saúde era grave mas estava tranquilo, a Revolução seguiria adiante; não era seu momento mais difícil depois que a URSS e o campo socialista tinham desaparecido. Bush estava no trono desde 2001 e tinha designado um governo para Cuba, mas uma vez mais, mercenários e burgueses ficaram com suas maletas e baús em seu exílio dourado.

Os ianques, além de Cuba, tinham agora outra Revolução na Venezuela. A estreita cooperação entre ambos os países passará também à história da América como exemplo do enorme potencial revolucionário dos povos com uma mesma origem e uma mesma história.

Entre os muitos pontos abordados no projeto de Informe ao 6º Congresso do Partido, um dos que mais me interessou foi o que se relaciona com o poder. Expressa textualmente: "...chegamos à conclusão de que é recomendável limitar a um máximo de dois períodos consecutivos de cinco anos o desempenho dos cargos políticos e estatais fundamentais. Isto é possível e necessário nas atuais circunstâncias, bem distintas às das primeiras décadas da Revolução, ainda não consolidada e por demais submetida a constantes ameaças e agressões."

A ideia me agradou. Era um tema sobre o qual eu tinha meditado muito. Acostumado desde os primeiros anos da Revolução a ler todos os dias os despachos das agências de notícias, conhecia o desenvolvimento dos acontecimentos em nosso mundo, acertos e erros dos partidos e dos homens. Abundam os exemplos nos últimos 50 anos.

Não os citarei, para não estender-me nem ferir susceptibilidades. Abrigo a convicção de que o destino do mundo podia ser neste momento muito diferente sem os erros cometidos por líderes revolucionários que brilharam por seu talento e seus méritos. Tampouco tenho a ilusão de que no futuro a tarefa será mais fácil, mas ao contrário.

Digo simplesmente o que a meu juízo considero um dever elementar dos revolucionários cubanos. Quanto menor seja um país e mais difíceis as circunstâncias, mais obrigado está a evitar erros.

Devo confessar que nunca me preocupei realmente com o tempo em que estaria exercendo o papel de presidente dos Conselhos de Estado e de Ministros e de primeiro-secretário do Partido. Eu era também, desde que desembarcamos, comandante em chefe da pequena tropa que cresceu tanto mais tarde. De Sierra Maestra renunciara a exercer a presidência provisória do país depois da vitória que desde cedo antevia para nossas forças, ainda bastante modestas em 1957; e o fiz porque já então as ambições com relação a esse cargo estavam obstruindo a luta.

Fui quase obrigado a ocupar o cargo de primeiro-ministro nos meses iniciais de 1959.

Raúl sabia que na atualidade eu não aceitaria nenhum cargo no Partido; era ele quem me qualificava de primeiro-secretário e comandante em chefe, funções que como se sabe deleguei na referida Proclamação quando fiquei gravemente enfermo. Nunca tentei, nem fisicamente podia exercê-las, mesmo quando tinha recuperado consideravelmente a capacidade de analisar e escrever.

Entretanto, ele nunca deixou de transmitir-me as ideias que projetava.

Surge outro problema: a Comissão Organizadora estava discutindo o número total de membros do Comitê Central que devia propor ao Congresso. Com muito bom critério, esta apoiava a ideia sustentada por Raúl de que no seio do Comitê Central se incrementasse a presença do setor feminino e a dos descendentes de escravos procedentes da África. Ambos eram os mais pobres e explorados pelo capitalismo em nosso país.

Por sua vez, havia alguns companheiros que, por sua idade ou saúde, não poderiam prestar muitos serviços ao Partido, mas Raúl pensava que seria muito duro para eles excluí-los da lista de candidatos. Não vacilei em sugerir-lhe que esses companheiros não fossem excluídos de tal honra e acrescentei que o mais importante era que eu não aparecesse nessa lista.

Penso que recebi demasiadas honras. Nunca pensei viver tantos anos; o inimigo fez todo o possível para impedi-lo, incalculável número de vezes tentou eliminar-me e eu muitas vezes “colaborei” com eles.

A tal ritmo avançou o Congresso que não tive tempo de transmitir uma palavra sobre o assunto antes que os delegados recebessem as cédulas de votação.

Por volta do meio-dia Raúl me enviou por meio de seu ajudante uma cédula e assim pude exercer meu direito ao voto como delegado ao Congresso, honra que os militantes do Partido em Santiago de Cuba me outorgaram sem que eu soubesse uma palavra sobre isso. Não o fiz mecanicamente. Li as biografias dos novos membros propostos. São pessoas excelentes, várias das quais conheci no lançamento de um livro sobre nossa guerra revolucionária na Aula Magna da Universidade de Havana, nos contactos com os Comitês de Defesa da Revolução, nas reuniões com os cientistas, com os intelectuais e em outras atividades. Votei e até pedi fotos do momento em que exercia esse direito.

Recordei também que ainda me falta bastante para contar sobre a história da Batalha de Girón. Trabalho nela e estou comprometido a entregá-la logo; tenho em mente, além disso, escrever sobre outro importante acontecimento que ocorreu depois.

Tudo antes que o mundo acabe!

Que lhes parece?

Fidel Castro Ruz
18 de abril de 2011, às 16h55

Fonte: Prensa Latina
Tradução: José Reinaldo Carvalho, editor do Vermelho
Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=152267&id_secao=7

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Drogas? por que não?

"De repente, na TV aberta, ao vivo, aquele delicadíssimo momento em que uma intelectual competente, acostumada a pensar com autonomia e a expor suas opiniões com liberdade, se esquece onde estava e quais eram as regras do jogo, e diz, bem na cara do rei, que ele está nu." (Juliana Coutinho)


domingo, 17 de abril de 2011

O sistema político em Cuba: uma democracia autêntica



“O governo do povo, pelo povo e para o povo” (Abraham Lincoln)

Ao estudar o sistema político vigente em Cuba, é necessário lembrar que seus antecedentes remontam a 1869, quando o povo da pequena ilha caribenha lutava de armas na mão pela independência do jugo colonial espanhol. Seus representantes se reuniram na parte do território já liberado e constituíram a Assembleia Legislativa, que aprovou a primeira Constituição da República de Cuba em armas.

Por Anita Leocadia Prestes, no ILCP

Era assim estabelecida a igualdade de todos os cidadãos perante a lei e abolida a escravidão até então existente. Essa primeira Assembleia Constituinte elegeu o Parlamento cubano daquela época e também, de forma democrática, seu presidente, assim como o presidente da República de Cuba em armas, designando ainda o chefe do Exército que levaria adiante a luta pela independência.

Cuba socialista reconheceu a importância de tal herança e, inspirada também nos ensinamentos do grande pensador e líder revolucionário José Marti, chegou a criar um sistema político que constitui um Sistema de Poder Popular único, autóctone, que não é cópia de nenhum outro. Em Cuba não existem os chamados três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), característicos do sistema político burguês. Há um só poder – o poder popular. Como o povo exerce o poder? Segundo a Constituição, o povo o exerce quando aprova a Constituição e elege seus representantes e, em outros momentos, mediante as Assembleias do Poder Popular e outros órgãos que são eleitos por estas Assembleias, como é o caso do Conselho de Estado, órgão da Assembleia Nacional. Portanto, o poder popular é único e exercido através das Assembleias do Poder Popular.

Outro elemento importante do sistema político cubano é a existência, de acordo com a Constituição, de um único partido – o Partido Comunista. Não se trata de um partido eleitoral, e por isso não participa do processo eleitoral, designando ou propondo candidatos ou realizando campanha a favor de determinados candidatos. Seguindo o caminho apontado por José Marti, fundador do Partido Revolucionário Cubano – partido único como única via para conquistar a unidade de todo o povo na luta pela independência e a soberania do país, e também na luta por justiça social –, o Partido Comunista de Cuba se diferencia do conceito clássico de partidos políticos; além de não ser um partido eleitoral, é o partido dirigente da sociedade, cujas funções e cujo papel são reconhecidos pela imensa maioria do povo. A definição do seu papel está inscrita na Constituição, aprovada em referendo público, mediante voto livre, direto e secreto de 97,7% da população.

É importante ressaltar que o PC é constituído pelos cidadãos mais avançados do país, o que se garante mediante um processo de consulta das massas. São os trabalhadores que não pertencem ao PC que propõem, em assembleias, as pessoas que devem ser aceitas em suas fileiras. Depois que o Partido toma decisão sobre as propostas dos trabalhadores, se reúne novamente com eles para informá-los. Quando toma decisões em seus congressos, o PC as discutiu antes com a população. O Partido não dá ordens à Assembleia Nacional do Poder Popular nem ao governo. O PC, após consultar o povo, sugere e propõe aos órgãos do Poder Popular e ao governo as questões que somente a essas instituições cabe o papel de decisão.

O Parlamento cubano se apoia em cinco pilares de uma democracia genuína e verdadeira, a saber:

O povo propõe e nomeia livre e democraticamente os seus candidatos.
Os candidatos são eleitos mediante voto direto, secreto e majoritário dos eleitores.
O mandato dos eleitos pode ser revogado pelo povo a qualquer momento.
O povo controla sistematicamente os eleitos.
O povo participa com eles da tomada das decisões mais importantes.

O sistema do Poder Popular em Cuba é constituído pela Assembleia Nacional, as Assembleias Provinciais, as Assembleias Municipais, o Conselho Popular e a Circunscrição Eleitoral, que é o degrau básico de todo o sistema. Nenhum desses órgãos está subordinado a outro, mas todos funcionam de forma que suas funções e atividades sejam complementares, tendo em vista alcançar o objetivo de que o povo possa exercer o governo de maneira prática e efetiva.

O sistema do Poder Popular se apresenta atualmente em Cuba da seguinte maneira: no nível nacional, a Assembleia Nacional do Poder Popular; em cada uma das 14 províncias, as Assembleias Provinciais do Poder Popular e, nos 169 municípios, as Assembleias Municipais; no nível de comunidade, os Conselhos Populares (1540); cada Conselho agrupa várias circunscrições eleitorais e é integrado pelos seus delegados, dirigentes de organizações de massas e representantes de entidades administrativas. No nível de base, ainda que sem formar parte de maneira orgânica da estrutura do sistema do Poder Popular, nem do Estado, tem-se a circunscrição eleitoral. A circunscrição eleitoral e o seu delegado são a peça-chave, a peça fundamental do sistema. A circunscrição se organiza para efeito das eleições, mas o delegado continua funcionando na área por ela abarcada e, por isso, a mesma continua sendo sempre denominada de circunscrição.

Participam das eleições todos os cidadãos cubanos a partir dos 16 anos de idade, que estejam em pleno gozo dos seus direitos políticos e não se incluam nas exceções previstas na Constituição e nas leis do país. Os membros das Forças Armadas têm direito a voto, a eleger e a ser eleitos. A Constituição estabelece que cada eleitor tem direito a um só voto. O voto é livre, igual e secreto. É um direito constitucional e um dever cívico, que se exerce de maneira voluntária, e quem não o fizer não pode ser punido.

Diferentemente dos sistemas eleitorais das democracias representativas burguesas, em que os candidatos aos cargos eletivos são escolhidos e apresentados pelos partidos políticos, em Cuba o direito de escolher e apresentar os candidatos a delegados às Assembleias Municipais do Poder Popular é exclusivamente dos eleitores. Esse direito é exercido nas assembleias gerais dos eleitores das áreas de uma circunscrição eleitoral da qual eles sejam eleitores. A circunscrição eleitoral é uma divisão territorial do município e constitui a célula fundamental do Sistema do Poder Popular. O número de circunscrições eleitorais em cada município é determinado a partir do número de seus habitantes, de maneira que o número de delegados das circunscrições à Assembleia Municipal nunca seja inferior a trinta.

O registro eleitoral em Cuba é automático, público e gratuito; todo cidadão, ao atingir os 16 anos de idade e estando em pleno gozo dos seus direitos políticos, é registrado como eleitor. Segundo a lei, no país são realizados dois tipos de eleições: 1) eleições gerais, em que são eleitos, a cada cinco anos, os deputados à Assembleia Nacional e demais instâncias de âmbito nacional, incluindo o Conselho de Estado, assim como os delegados às Assembleias Provinciais e Municipais e seus presidentes e vice-presidentes; 2) eleições parciais, a cada dois anos e meio, em que são eleitos os delegados às Assembleias Municipais e seus presidentes e vice-presidentes. Deve-se assinalar que tanto os deputados à Assembleia Nacional quanto os delegados às Assembleias Provinciais e Municipais são eleitos diretamente pela população.

As eleições são convocadas pelo Conselho de Estado, órgão da Assembleia Nacional que a representa entre os períodos de suas sessões, executa suas decisões e cumpre as funções que a Constituição lhe atribui. Para organizar e dirigir os processos eleitorais, são designadas Comissões Eleitorais Nacional, Provinciais, Municipais, de Distritos, de Circunscrição e, em casos necessários, Especiais. A Comissão Eleitoral Nacional é designada pelo Conselho de Estado, as Comissões Provinciais e Especiais são designadas pela Comissão Eleitoral Nacional, as Comissões Eleitorais Municipais pelas Comissões Eleitorais Provinciais e assim por diante. Todos os gastos com as eleições são assumidos pelo Orçamento do Estado; portanto os candidatos nada gastam durante todo o processo eleitoral.

Para elaborar e apresentar os projetos de candidaturas de delegados às Assembleias Provinciais e de deputados à Assembleia Nacional e para preencher os cargos que são eleitos por elas e as Assembleias Municipais, são criadas as Comissões de Candidaturas Nacional, Provinciais e Municipais integradas por representantes das organizações de massas e de estudantes e presididas por um representante da Central de Trabalhadores de Cuba, assegurando desta maneira a direção dos trabalhadores em todo o processo eleitoral.A propaganda eleitoral é feita exclusivamente pelas Comissões Eleitorais, garantidas a todos os candidatos condições de igualdade; nenhum candidato pode fazer campanha para si próprio.

Para ser proposto como candidato a deputado à Assembleia Nacional, é necessário ter sido apresentado como pré-candidato por uma das organizações de massas do país, que a Comissão Nacional de Candidaturas submeta essa proposta à consideração da Assembleia do Poder Popular do município correspondente, e que esta, pelo voto de mais da metade dos delegados presentes, aprove a sua designação como candidato por esse território. Será considerado eleito deputado à Assembleia Nacional o candidato que, tendo sido apresentado pela respectiva Assembleia Municipal, tenha obtido mais da metade dos votos válidos emitidos no município ou Distrito Eleitoral, segundo o caso de que se trate. As eleições para os demais níveis do Poder Popular seguirão a mesma sistemática.

Em Cuba, os deputados à Assembleia Nacional e os delegados às demais Assembleias não recebem nenhum tipo de remuneração pelo exercício do mandato popular; continuam exercendo suas profissões em seus locais de trabalho e recebendo o salário correspondente. A Assembleia Nacional se reúne duas vezes ao ano, as Provinciais e Municipais com maior frequência. Os deputados e delegados exercem seus mandatos junto aos seus eleitores, prestando-lhes contas periodicamente e podendo, de acordo com a lei, serem por eles removidos a qualquer momento, desde que, em sua maioria, considerem que seus representantes não estão correspondendo aos compromissos assumidos perante o povo.

Sem espaço para um exame mais detalhado do Sistema Político de Cuba, é esclarecedor, entretanto, abordar o processo de eleição do presidente do país, que é o presidente do Conselho de Estado e do Conselho de Ministros. Para ser eleito presidente, é necessário ser deputado e, por isso, deve ter sido eleito por voto direto e secreto da população, da mesma forma que todos os 609 deputados da Assembleia Nacional. No caso específico, por exemplo, do presidente Fidel Castro, ele foi designado candidato pela Assembleia Municipal de Santiago de Cuba e eleito pelos eleitores de uma circunscrição do município e, além disso, eleito pela maioria, pois a lei eleitoral estabelece que nenhum deputado pode ser eleito sem obter mais de 50% dos votos válidos. Posteriormente, sua candidatura a presidente do Conselho de Estado foi votada pelos deputados, devendo alcançar mais de 50% dos votos para ser considerado eleito.

A abordagem realizada do Sistema Político de Cuba, ainda que sucinta, evidencia seu caráter popular e democrático, que é, entretanto, permanentemente distorcido e falsificado pela mídia a serviço dos interesses do grande capital internacionalizado.

Referências bibliográficas

PEREZ, Jorge Lezcano. El Poder Popular en Preguntas y Respuestas. La Habana, Ediciones Poder Popular.

El Sistema Electoral Cubano y el Delegado de Circunscripción. La Habana, Ediciones Poder Popular.

El Sistema Político de Cuba. La Habana, Ediciones Poder Popular, 2004.

Como funciona el Parlamento cubano? La Habana, Ediciones Poder Popular.

Cuba socialista y el Poder Popular. La Habana, Ediciones Poder Popular.

* Anita Leocadia Prestes é professora do Programa de Pós-graduação em História Comparada da UFRJ e presidente do Instituto Luiz Carlos Prestes.