"Nossa cultura é a macumba, não a ópera. Somos um país sentimental, uma
nação sem gravata"
(Glauber Rocha)


domingo, 14 de novembro de 2010

Elites jurídicas controlam o sistema Judiciário



Aí galera: vai aí um estudo daqueles que valem a pena ser lidos, porque não ficam discutindo sexo dos anjos, mergulhando de verdade nas grandes conexões que determinam nossas vidas. Velhas elites que perderam espaço na política brasileira, principalmente no legislativo e no executivo estão se aninhando cada vez mais no Poder Judiciário, que vem conformando um poder perigoso e autoritário, na medida em que se tem reservado o poder de "dar a última palavra" em assuntos de poder, numa nação que se orgulha de assentar sobre a "soberania popular". Não à toa, um dos temas da moda na nossa pós-graduação vem sendo os ligados ao "neoconstitucionalismo", que tem uma tendência inexorável a defender fortes discricionariedades por parte do Judiciário, tomado como "guardião da democracia", embora sofra, ele mesmo, de fortes déficits democráticos. Para quem quiser acessar o trabalho, ele está disponível na net no endereço: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-08102010-143600/pt-br.php. Boa leitura!

Por Marcelo Pellegrini - marcelo.pellegrini.filho@usp.br
Publicado em 8/novembro/2010


Em estudo concluído em setembro sobre o sistema jurídico brasileiro, o cientista político Frederico Normanha Ribeiro de Almeida verifica a existência de uma política entre grupos de juristas influentes dentro do sistema jurídico nacional, no sentido de formar alianças e disputar espaço, cargos e poder dentro da administração do sistema. Segundo Almeida, este é um estudo inovador, pois constata um jogo político “difícil entender em uma área em que as pessoas não são eleitas e, sim, sobem na carreira, a princípio, por mérito”.

Em sua tese de doutorado A nobreza togada: as elites jurídicas e a política da Justiça no Brasil, orientada pela professora Maria Tereza Aina Sadek da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, o pesquisador identificou, por meio de entrevistas, análises de currículos e biografias e uma análise documental da Reforma do Judiciário, três tipos de elites políticas dentro do sistema Judicial brasileiro: elites institucionais, profissionais e intelectuais.

Segundo ele, as elites institucionais são compostas por juristas que ocupam cargos chave das instituições da administração da justiça estatal, como o Supremo Tribunal Federal (STF), Superior Tribunal de Justiça, Tribunais Estaduais, Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Conselho Nacional de Justiça( CNJ).

Já as elites profissionais são caracterizadas por lideranças corporativas dos grupos de profissionais do Direito atuantes na administração da justiça estatal, como a Associação dos Magistrados Brasileiros, OAB e a Confederação Nacional do Ministério Público.

O último grupo, as elites intelectuais são formadas por especialistas em temas relacionados à administração da justiça estatal. Este grupo, apesar de não possuir uma posição formal de poder, possui influência nas discussões sobre a área e em reformas políticas, como no caso dos especialistas em direito público e em direito processual.

Características comuns às elites
No estudo verificou-se que as três elites políticas identificadas possuíam em comum a origem social, as Universidades e as trajetórias profissionais. Segundo Almeida, “todos os juristas que formam esses três grupos provém da elite ou da classe média em ascensão e de Faculdades de Direito tradicionais, como o Faculdade de Direito (FD) da USP, a Universidade Federal de Pernambuco e, em segundo plano, as Pontifícias Universidades Católicas (PUC’s) e as Universidades Federais e Estaduais da década de 60”.

Em relação às trajetórias profissionais dos juristas que ocupam essa elite, Almeida aponta que a grande maioria desses profissionais já exerceram advocacia, o que revela que “a passagem pela advocacia tende a ser mais relevante do que a magistratura”. Exemplo disso, é que a maior parte dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que são indicados pelo Presidente da República, serem ou terem exercido advocacia em algum momento de sua carreira.”

O cientista político também aponta que apesar de a carreira de um jurista ser definida com base no mérito, ou seja, via concursos, há um série de elementos que influenciam os resultados desta forma de avaliação. Segundo ele, critérios de avaliação como porte e oratória, favorecem indivíduos provenientes da classe média e da elite sócio-econômica, enquanto a militância estudantil e a presença em nichos de poder são fatores diretamente ligados às relações construídas nas faculdades.

“No caso dos Tribunais Superiores, não há concursos, são exigidos como requisito de seleção ‘notório saber jurídico’, o que, em outras palavras, significa ter cursado as mesmas faculdades tradicionais que as atuais elites políticas do Judiciário cursaram”, afirma o pesquisador.

Por fim, outro fator relevante notado nos levantamentos do estudo foi o que Almeida denominou de “dinastias jurídicas”. Ou seja, famílias que estão presentes por várias gerações no cenário jurídico.

“Notamos que o peso do sobrenome de famílias de juristas é outro fator que conta na escolha de um cargo-chave do STJ, por exemplo. Fatores como estes demonstram a existência de uma disputa política pelo controle da administração do sistema Judiciário brasileiro”, conlcui Almeida.

Fonte: Agência USP de Notícias.

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